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Se há algo que tenho visto aqui na Áustria nos últimos dias, são montanhas. Gigantescas e imponentes. Nessa época do ano, estão todas cobertas de neve.

Modéstia não é uma das minhas forças. Mas é fácil lembrar como sou pequeno diante dessas montanhas. Elas não são opressoras, mas confesso que, ao contemplá-las, às vezes me sinto oprimido.

Hoje, estive no alto de uma delas. Tão alto que cheguei ao cume de “bondinho” depois de vários minutos de viagem. Lembrei do ensinamento de Cristo registrado em Mateus 17, que diz que bastaria uma Fé do tamanho de um grão de mostarda para mover qualquer montanha.

Nunca deixo de me surpreender com a didática do mestre. Aqui, Ele escolheu uma das menores sementes para confrontar uma das maiores manifestações físicas da criação.

No alto da montanha, comecei a pensar sobre a Fé. O que é a Fé?

A Fé, Paulo ensinou, é o firme fundamento do que se espera e a prova daquilo que não se pode ver. Imagine um agricultor que planta uma semente sem ver o que há debaixo da terra, mas acredita firmemente que, em algum momento, ela germinará. Assim é a Fé: acreditar naquilo que não vemos, mas esperamos com confiança.

A Fé, Tiago ensinou, é persistente e ativa. Sem ação, a Fé é morta. A Fé é chamar à existência algo que ainda não existe como se já existisse. Sem dúvidas. Aliás, é interessante que até mesmo Deus manifesta Fé em Gênesis, pois em toda a narração da criação Ele primeiro chamou as coisas para que elas então existissem (como em “Que se faça a luz e a luz se fez”).

Voltando à montanha e à mostarda, tenho eu Fé? Poderia eu mover a montanha? Só por perguntar, percebo que a que tenho ainda é suficiente. Humildemente reconheço que até a mostarda não tem nada de pequena e que também precisa ter a sua. “grandeza” reconhecida. Quanto a mim, o jeito é continuar avançando.

Que eu a desenvolva então, de maneira ativa, não para mover montanhas da Áustria ou de lugar algum, mas para mover a mim mesmo. Que essa Fé me permita transformar meus dias, enfrentar desafios cotidianos e ser uma versão melhor de mim a cada dia.

Para todo lugar que olho, vejo montanhas. Acho que é hora de procurar por mais sementes de mostarda. Um passo de cada vez!

24/11/2024

Por que Salomão pecou?

Essa é uma pergunta difícil de responder, afinal, Salomão, filho de Davi, conhecido por sua grande sabedoria e por ter governado Israel durante um período de paz e prosperidade, recebeu de Deus as dádivas da sabedoria e da riqueza. Conforme as escrituras, nunca haveria homem mais rico, tampouco mais sábio.

Ainda assim, Salomão pecou. Por quê?

Muitos crentes diriam que o que levou Salomão ao pecado foram as mulheres. Salomão teve 700 esposas e 300 concubinas, muitas delas estrangeiras. Segundo os “crentes”, essas mulheres, sendo estrangeiras, levaram Salomão a adorar outros deuses. Particularmente, considero isso pouco provável, pois acredito que a sabedoria de Salomão o teria prevenido de ser facilmente influenciado, especialmente em questões de fé e adoração.

Salomão era versado em botânica e entendia de química, logo, suponho eu, conseguia produzir substâncias alucinógenas ou medicinais como bem entendesse. Acredito, inclusive, que ele tenha feito isso.

Salomão também foi escolhido por Deus para construir o primeiro templo, e, quando orou, fogo caiu do céu como sinal da aprovação divina. Esse evento demonstrava que Deus aceitava o sacrifício e a dedicação do templo, representando um momento de confirmação espiritual e da presença de Deus entre o povo de Israel. Quando Salomão clamava, Deus respondia de forma inequívoca, não apenas de maneira discreta.

Mas, voltando à questão inicial, por que Salomão pecou?

Certa vez, perguntei isso a um bom amigo. A resposta dele veio rápida, como se fosse a expressão de um tema já há muito pensado e uma questão há muito respondida. Segundo meu amigo, Salomão pecou por solidão.

Salomão estava só e sentia-se só, pois, apesar de toda a sua riqueza e sabedoria, não encontrava companheirismo verdadeiro. Sua posição e responsabilidades o isolavam dos outros, e essa solidão constante o levou a buscar consolo em caminhos que acabaram por afastá-lo de Deus. Os conselheriros de Salomão aconselhavam-se com ele. Certa vez, ele disse que, entre mil homens, encontrou um (ele mesmo, creio eu). Entre mil mulheres, nenhuma.

A solidão pesa, e talvez meu amigo esteja certo. Acho bem provável que a solidão tenha sido a causa verdadeira pelo qual Salomão pecou.

21/11/2024

Ontem, fiz uma viagem de Viena a Salzburgo. A paisagem era deslumbrante: montanhas cobertas de neve ao fundo e vilarejos encantadores ao longo do caminho. O Waze foi meu guia.

Hoje em dia, não consigo mais andar sem o Waze. Essa dependência, porém, me preocupa.

Não me entenda mal: sistemas de GPS são essenciais e revolucionaram o turismo. Com um GPS, encontramos pontos turísticos escondidos, trilhas pouco conhecidas e restaurantes locais. Se errarmos uma rota, temos orientação imediata. Podemos explorar lugares desconhecidos sem depender de mapas de papel ou da boa vontade de estranhos.

Lembro-me bem de como era quando sistemas de GPS não eram comuns. Uma vez, em Porto Alegre, lembro-me de passar horas, como passageiro, atrapalhado com um mapa de papel, tentando chegar a um shopping. A situação era ainda mais difícil em São Paulo, onde avenidas mudam de nome do nada.

Liberdade, entretanto, não dispensa cuidados. Confiar cegamente no GPS pode nos colocar em situações complicadas. Além de rotas indesejadas, podemos acabar em caminhos mais longos ou até em áreas de risco. Já foi pior no passado, mas ainda é um problema. Ontem, quase fui vítima desse descuido.

Aqui na Áustria, o pedágio funciona de forma diferente. Não há cancelas visíveis. Tudo é digital, com etiquetas fixadas nos para-brisas dos carros (o Rio Grande do Sul está adotando um sistema similar). Funciona como a cobrança automática no Brasil, mas aqui as tags não são opcionais. Ou melhor, são — e esse é o problema.

Ao usar o Waze na Áustria, ele pergunta se você tem a etiqueta de pedágio. Se não tiver, ele sugere uma rota alternativa, que funciona, mas leva mais tempo. Ontem, por não conhecer bem a configuração do Waze, respondi que não tinha a etiqueta e fui direcionado para uma rota que levaria cinco horas, em vez de três pela rota pedagiada.

Comecei a viagem, mas logo estranhei o tempo exagerado e os belos caminhos entre cidadezinhas, bem longe das rodovias menos pitorescas, porém mais rápidas. Casas coloridas, ruas estreitas, campos verdejantes. Resolvi verificar o que havia de errado. Achei. Foi por pouco.

Se eu tivesse simplesmente aceitado o caminho proposto pelo Waze, teria viajado muitas horas a mais. No Google Maps, nem consegui encontrar opção para informar que tinha a tal etiqueta; logo, invariavelmente faria o caminho mais lento.

O Waze é ótimo. O Google Maps também. Eles nos dão liberdade, mas exigem cuidados. É preciso sempre verificar as rotas sugeridas, evitar desvios desnecessários, prestar atenção em restrições locais e ter uma noção geral do caminho e de como as coisas funcionam em cada lugar.

Você não pode desligar o cérebro.

21/11/2024

Ontem visitei a Biblioteca Nacional de Viena, uma das maiores e mais importantes bibliotecas históricas do mundo. Conhecida por seu acervo inestimável e arquitetura impressionante.

Um prédio magnífico, com pé-direito alto. Amplos vitrais deixam a luz natural inundar o ambiente, criando reflexos dourados sobre as prateleiras e destacando a textura envelhecida dos livros. A atmosfera é quase etérea, e caminhar pelo espaço transmite uma sensação de calma reverencial, como se cada passo fosse parte de um ritual sagrado. Livros se estendem do piso ao teto.

Livros raros, sem dúvida. Muitos carregam séculos de história e conhecimento acumulado. Agora estão inertes, restritos pelas necessidades de conservação que impedem seu manuseio, como se estivessem em exibição apenas para serem admirados à distância, preservados para proteger seu valor histórico. A biblioteca lembra, em muitos aspectos, um mausoléu imperial, com suas colunas austeras e silêncio profundo. Um lugar para prestar homenagens a algo que já foi, mas já não é, como corredores vastos e frios que guardam vestígios de um passado glorioso, mas sem vida.

Desde manuscritos medievais até primeiras edições de obras clássicas. De alguns poucos, há reproduções de páginas sob redomas de vidro. Permitem apenas uma pequena amostra de seu valor, como relíquias de um passado distante. Entretanto, o valor real para os visitantes é similar ao das caixas que imitam livros e enfeitam salas. Objetos que parecem valiosos, mas cuja função é meramente decorativa.

Milhares de livros. Todos dormentes, inertes. Como se tivessem perdido o propósito original. Talvez alguns estejam quase apodrecendo, esquecidos pelo tempo. Nada resta de sua função original. Para os gregos, seriam considerados sem virtude, desprovidos de propósito. Nenhum podia ser tocado ou folheado.

Afinal, que valor tem um livro que não pode ser lido?

Pobres e podres livros antigos. Se vontade e escolha tivessem, não escolheriam desmancharem-se nas mãos inábeis de um novo leitor a permanecerem expostos para a eterna inutilidade?

20/11/2024

Tomando café pela manhã, avistei uma torre que chamou minha atenção – era um Flakturm.

Era uma edificação alemã da Segunda Guerra Mundial, usada como torre de artilharia antiaérea. Essas estruturas protegiam as cidades dos ataques dos Aliados e abrigavam civis durante bombardeios.

Blocos acinzentados, enormes, com paredes espessas e janelas estreitas como fendas. Suas superfícies eram desgastadas e cobertas de musgo. A altura imponente e a aparência fria e opressiva, confesso, me causam medo.

Construídos com concreto reforçado, projetados para resistir a bombardeios, são extremamente sólidos e difíceis de demolir. Por isso, permanecem de pé até hoje.

O povo de Viena decidiu integrá-los à cidade. Aceitar essas construções, antes horrendas, e transformar o passado em parte do presente. Resiliência e adaptação são marcas da identidade vienense.

Alguns desses blocos já não são vistos de forma negativa. Muitos foram revestidos com vidro e estruturas metálicas e ganharam novas funções: centros culturais, museus, aquários. Assim, trouxeram nova perspectiva e utilidade a essas edificações.

De um dos temidos Flakturms nasceu o Haus des Meeres – um aquário vertical com onze andares. Lá dentro, há tubarões, répteis e áreas de aves tropicais. No topo, um terraço panorâmico com vistas impressionantes da cidade.

Subi os onze andares a pé. Em cada um, havia uma atração. Até um dragão-de-komodo encontrei por lá. Cada andar era uma surpresa!

O que pensei? Que até o que é horrendo pode se tornar incrível. Basta ser “revestido” e usado da forma certa.

Viena transformou estas torres sombrias em símbolos de resiliência e criatividade. Elas agora fazem parte da vida moderna da cidade.

Flakturm. Torre antiaérea. Primeira vez que me prestei a subir, por escadas, onze andares.

19/11/2024

Estou na Áustria nesses dias, terra de Mozart. Ele era um gênio, e sua obra resiste ao tempo.

Visitei o Palácio de Schönbrunn, antiga residência da (extinta) monarquia austríaca. O palácio resistiu ao tempo; a monarquia, não.

Antes centro do poder, o palácio hoje abriga um museu. Na verdade, pode-se dizer que o palácio inteiro é um museu. Nele, plebeus como eu podem explorar as acomodações da realeza. Um destaque curioso são os sanitários reais, que mostram que reis e rainhas, considerados quase sobre-humanos, eram, no fim das contas, como você e eu.

Durante a visita ao palácio — ou melhor, ao museu —, chamou-me a atenção a prataria: linda, porém empoeirada.

Entre as salas mais fascinantes está aquela onde o jovem Mozart, com apenas seis anos de idade, tocou para a imperatriz — um fato histórico amplamente conhecido.

Pensando bem, talvez tenha sido a imperatriz quem teve a sorte de ouvir o pequeno Mozart. Afinal, sua obra o tornaria gigante, resistindo ao tempo e dando a impressão de ser eterna. Quanto à imperatriz, confesso que aprendi sobre ela ontem e, agora, enquanto escrevo, já não lembro seu nome.

19/11/2024